quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Gastona


Tempo gasto, prosa gasta, mão gasta, coração gasto, dinheiro gasto, cama, lençol, pensamento, vontade, sapato, vontade, desejo, sonho... Gastos. O que a gente precisa é saber a dose certa, a hora de parar. Até que reste algo pro próximo. Até que o gasto seja substituído pelo refeito. Ou ao menos que o gasto seja refeito em algo imperceptivelmente novo, límpido e certo, seguro de pisar, afinal, a quem interessa o gasto? Gasto só interessa quando parece novo. Recicle o gasto. Se desfaça do desnecessário, doe a quem precise. Já foi gasto, mas tem uso. Os amores, então... Doe sempre! Melhor doar gasto com gosto, que desgastado sem gosto.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

O texto a seguir havia sido escrito há uns meses atrás e eu me vi obrigada a publicá-lo, assim que soube que Pedro, que parecia um membro da ABL, morreu hoje pela manhã...

Pedro de Lara lá

Prevejo a grande síndrome dos anos vindouros: é a SPL – Síndrome de Pedro de Lara. Para quem não sabe, Pedro de Lara era um jurado de um programa daquele que não é membro da ABL, mas parece imortal, Sílvio Santos. O programa era o “Show de Calouros”, e apesar do nome, não possuía adolescentes pintados pedindo dinheiro, mesmo que um ou outro candidato fosse tão deprimente quanto os calouros acadêmicos. A característica mais marcante de Pedro, além da carência de beleza, era um mau humor inabalável de pessoa que não se surpreende positivamente com nada. Em suma: acha tudo uma merda. Prevejo que os jovens de hoje em dia, com todas essas facilidades de tudo verem, ouvirem, tudo conhecerem, não se abalarão com nada. Conhecerão tudo superficialmente: o “ouvir falar” no lugar do “conhecer”. Nada será suficientemente bom a ponto de digno de um elogio. Seremos velhos rabugentos que raramente sorriem. Teremos constantemente aquela rugazinha do descontentamento na testa. Andaremos por aí com duas músicas de cada banda, duas frases de cada livro, pedacinhos de cada quadro... Tudo baixado pela rapidez da Internet e dissipado com a agilidade cibernética de banda larga. Pedros de Lara lá, aqui e em todo lugar.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Tomando no orkut até a morte

- Poxa, cara... Vinte e cinco anos de amizade... Isso é quase um casamento! Desde os tempos da faculdade de Direito... Nos víamos todos os dias... Desde nosso primeiro porre juntos, até as listas de calouras que comíamos... Desde o companheirismo na saúde e na doença, nos problemas do escritório e das causas vencidas... Os apadrinhamentos de casamento e dos filhos... Os cabelos brancos surgindo lentamente e a barriga crescendo rapidamente... E depois de toda essa vida vivida, você não foi ao meu enterro?!
- Desculpa aí, Pedrão! Mas eu te mandei um scrap, cara!
- Ah tá... É que não tive tempo de abrir orkut depois que morri...
- Então... Fiz até comunidade em sua homenagem!
-Pô, cara.. Tô emocionado...

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Assim espero...

Eu espero. Espero muito. Espero bastante das pessoas. Espero que elas tenham bom senso. Espero que alguém atravesse meu caminho e me conte uma boa história. Espero que alguma criança com toda sua inteligência me ensine algo nos minutos em que vou observá-la. Espero pelas mudanças. Espero pelos sinais que mostrem caminhos. Espero ter onde me focar. Espero pela concretização de planos e de sonhos. Espero que o mínimo acontecimento me faça refletir tanto que me inspire. Espero as inspirações. Aspiro pelas inspirações, esperando que se dêem a partir de meus olhares. Espero que elas me atinjam como flechas que a dor não faz calar até que sejam arrancadas. Enquanto isso, eu espero sentada pelo meu futuro promissor.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

Mais uma dose

Estava às vésperas de completar 30 anos e recém saída de uma relação rápida com um homem casado. Fernando era casado com alguém que me fazia amante sem chances de aspirar ao cargo de oficial: o trabalho. Acordava-me com uns sussurros em francês, que seriam românticos se ditos ao pé do ouvido, ainda que eu não entendesse porra nenhuma daquilo: era ele estudando e tornando o francês impecável. Conheci Carlos Alberto um mês depois, numa boate. As amigas investiam em minha volta ao mundo dos solteiros, ainda que eu achasse aquilo tudo muito triste. Enfim cedi, depois de um joguinho de bancar a desentendida e o beijei. Fomos conversar e foi então que descobri: 21 anos. Fiquei estarrecida, mas vaidosa e não me importei com uma trepada amiga de uma noite, ainda que nove anos mais nova. Acontece que a foda amiga me surpreendeu. Ele procurava os bicos dos meus seios e os chupava de uma forma, ora maternal, ora violenta, e eu só conseguia admirá-lo. Explorava cada parte de meu corpo, numa curiosidade que só me fazia querer mais. Toda aquela falta de experiência me reacendendo a libido. Uma preocupação latente de me satisfazer. Depois eram os papos que me surpreendiam. E eu me fazendo de bem resolvida, mas me condenando interiormente. Com um conservadorismo medíocre de “o que vão pensar de mim?”. E eu me fazendo de bem resolvida, mas me apaixonando por todo encanto da falta de pêlos do mancebo e toda aquela inteligência... E o menino, com um apetite que me deixava as pernas bambas. Até o dia em que tomei a coragem de perguntá-lo, após ter bebido alguns vinhos, se ele só queria me comer e ele respondeu: “quero seu sexo e suas palavras”. Comecei a amá-lo a partir desse momento. E fui correspondida. Hoje vivo um romance embriagado, antes por uma paixão prematura, que pelos copos virados de bebida.

domingo, 27 de maio de 2007

Que se chova!

No verão, desejamos o gelado. No inverno, o quente. No calor: sorvete, praia, ar condicionado, cerveja. Tudo bem geladinho, por favor. No frio: cobertas, casacos, café, aquecedor. Tudo bem quentinho, por favor. Frio demais, frio de menos. Calor de mais, calor de menos. Não há o meio termo, apenas a insatisfação. Seria o tempo, no sentido metereológico do termo, representativo dessa nossa necessidade de inaceitar o que é natural?! Uma inquietação própria de querer sair da condição que nos é imposta?! Não me venham com essa de aceitar de bom grado as dádivas divinas! Se assim fosse, agradeceríamos e aceitaríamos cordialmente as chuvas sejam chuviscos ou dilúvios, e os sóis, sejam fracos ou escaldantes. O tempo é representativo, a meu ver, de uma propriedade puramente humana de mau agradecimento. Chova ou faça sol, uns maus agradecidos.